O estranho ser chamado torcedor de futebol.
Comecei a frequentar o Maracanã muito cedo, e já achava esquisito o comportamento do torcedor-padrão. Gostava de ver as partidas compenetrado, procurando absorver a tensão e tentando compreender o que se passava dentro do campo. É óbvio que a emoção de estar no estádio é única e incomparável. Por outro lado, o cara que pula e canta e dança e grita e xinga e chora e bate palma, na boa, esse cara não tem a menor condição de entender o que se passa no jogo.
Na última Copa, a tevê mostrou imagens dos torcedores africanos fazendo trenzinho na arquibancada, enquanto a bola rolava. Esses caras estavam vendo o quê? Entendendo o quê?
Eu ia muito ao Maraca com meus irmãos mais velhos e alguns amigos deles. O mais agitado, apelidado de Empada, só sentava ao meu lado e passava o jogo inteiro chamando o vendedor de Coca-Cola, o sorveteiro, o amendoim. Aí a torcida vibrava ou chiava, o Empada virava pra mim e perguntava o que tinha acontecido – e eu tinha que descrever o lance. Eu sempre achei que o principal motivo para o Empada ir ao Maracanã era o cachorro-quente do Geneal.
Por morar em São Caetano e ser flamenguista, hoje virei um torcedor televisivo e considero o pay-per-view a maior invenção da humanidade. Esse distanciamento me permitiu enxergar o quanto o torcedor que vai ao campo tem dificuldade para entender o que acontece no jogo e sacar as necessidades do time.
Um bom exemplo: a relação entre o Petkovic (recentemente dispensado por Vanderlei Luxemburgo) e a torcida do Flamengo. Tá certo: o Pet fez o maior gol de falta da história, na conquista do tri estadual em 2001, e arrebentou no Brasileirão do ano passado. Mas isso pôs uma venda nos olhos do torcedor rubro-negro. No ano passado, jogavam Flamengo e Corinthians no Maracanã, pela Libertadores. Zero a zero, jogo duríssimo, gramado encharcado, o Flamengo com um a menos por causa da expulsão do idiota do Michael ainda no primeiro tempo, ou seja, o time precisando mais do que nunca de quem corresse, a torcida vai e começa a gritar Pet! Pet! Pet! E olha que o Pet já não se aguentava em pé desde o início da temporada.
Essa, acho, é uma das vantagens do torcedor de sofá: ter mais facilidade para entender o que se passa no campo. Principalmente se a gente desligar o som da tevê e não ouvir as atrocidades cometidas pelos comentaristas.
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