segunda-feira, 25 de março de 2013

A seleção dando a cara pra bater. 
É certo que a insuportável chatice dos campeonatos estaduais colabora, mas a escolha de adversários de verdade vem tornando os jogos da nossa seleção mais interessantes. Creio que mesmo o mais pacheco dos nossos torcedores há de reconhecer que, numa fase preparatória, é melhor perder de dois a um para a Inglaterra do que ganhar de oito a zero da China. Quando você perde de dois a um da Inglaterra, você observa quem foi bem e quem decepcionou, quem merece voltar e quem já deu o que tinha que dar, quem jogou a chance fora e agora precisa ralar pra ser convocado de novo. Quando você enfia oito a zero na China, o cara pode fazer cinco gols que não quer dizer nada. 
Aproveitei o final de semana de partidas tenebrosas pelos estaduais pra ver Brasil x Itália. O jogo foi bem bom e já deu pra perceber alguma coisa parecida com uma seleção brasileira, inclusive com Neymar jogando bola. Começou o lance do primeiro gol com uma longa e bela inversão para Hulk, fez toda a jogada do segundo e ainda deixou Hulk na cara do Buffon, com tudo em cima pra fazer o terceiro e garantir a vitória, mas Hulk foi afoito, pisou na bola, se desequilibrou e perdeu a chance. 
Continuo achando que a seleção terá que se esforçar muito mais do que o normal para reconquistar a torcida, devido a um problema que é pouco citado e – pior que isso – sequer é visto como problema: a falta de identificação do torcedor com determinados jogadores. Não me refiro ao fato do cara atuar no exterior. A questão é que temos jogadores que jamais vimos jogar, e é sempre mais difícil torcer por quem não conhecemos. Nossa seleção começou a partida contra a Itália com uma zaga (Daniel Alves, David Luiz, Dante e Filipe Luís) que nunca ninguém viu atuar em clubes brasileiros. Além deles, havia o Hulk lá na frente, mais o Luiz Gustavo e o Diego Costa que entraram depois. As muitas partidas já disputadas pela seleção e o sucesso do Barcelona se encarregaram de familiarizar Daniel Alves com o torcedor brasileiro, David Luiz também vai ficando conhecido, mas querer que os torcedores se identifiquem com quem nunca viram em campo é exigir demais.
Reconheço que oficializar este critério é inviável, pois criaria uma situação de preconceito e teria gente até citando algum artigo da Declaração Universal dos Direitos Humanos, mas não precisa ser oficial, né? Basta jogo de cintura. Se há um cara de grande talento e superioridade indiscutível, beleza. Sejamos flexíveis. Mas, na boa, qual a vantagem de convocar o Luiz Gustavo? Não sou um grande entusiasta do Leandro Damião, mas pelo que vi contra a Itália o Diego Costa não é melhor que ele. Então, pra quê? 
De qualquer modo, tivemos uma seleção em campo. Tivemos adversário. Tivemos um jogo de futebol de verdade e um teste válido. Hoje a parada é com a Rússia, e me animei pra deixar gravando. O que já é um avanço em relação ao pouco caso que a seleção vinha merecendo de todos nós.

segunda-feira, 18 de março de 2013

Gênios incompreendidos. 
Outro dia fui buscar um texto na sala do corintiano Serginho – é lá que ficam as impressoras da agência – e ele me perguntou: “Ô Murta, quando é que a gente vai começar a ter jogo bom pra ver?” Corinthians e Palmeiras (2 x 2) até que foi divertido, alguns clássicos no primeiro turno do Campeonato Carioca foram bem disputados, mas o Serginho tem razão. Não basta ser corrido ou brigado, não basta ter gols bonitos ou jogadas bacanas: pro jogo ser bom de verdade, tem que valer alguma coisa importante. A passagem pra fase seguinte da Libertadores ou a eliminação, a chance de continuar brigando pelo título brasileiro, algo assim. Se não, fica essa coisa morna e chocha. E enquanto a temporada não esquenta, os personagens principais passam a ser nossos técnicos – esses gênios. 
Neste momento, dois estão na berlinda: Ney Franco e Dorival Jr. Não vejo nada de extraordinário em nenhum treinador brasileiro, mas todos são absurdamente teimosos. Num país em que todo mundo é técnico de futebol, ter convicção é importante, mas isso é bem diferente de não enxergar o óbvio. Sempre disse aqui que Dorival Jr. não poderia fazer milagres com o fraco elenco do Flamengo, mas era obrigação dele fazer o melhor possível. Só que em momento algum o time teve padrão – aliás, o último time do Flamengo com padrão de jogo foi o do segundo semestre de 2009, dirigido pelo Andrade e campeão brasileiro. Além disso, certas teimosias são inadmissíveis e imperdoáveis. O Brasil tem duzentos milhões de habitantes. Não é possível que não existam pelo menos duzentos volantes (0,0001% da população) melhores que o Cáceres. Agora, Jorginho vem aí. Oremos. 
Ney Franco balança, por causa da Libertadores, mas não cai, por causa do estadual. Situação complicada. Ney apareceu para o futebol brasileiro dirigindo o Ipatinga, clube em que foi campeão mineiro em 2005 e semifinalista da Copa do Brasil de 2006. Chegou ao Flamengo para disputar a final dessa mesma Copa do Brasil – a competição teve um mês de intervalo entre semifinal e final, por causa da Copa do Mundo –, foi campeão ganhando os dois jogos contra o Vasco e teve o mérito de lançar Renato Augusto no time de cima. Mas, a partir daí, transformou a Gávea num autêntico consulado mineiro: houve um período em que o Flamengo tinha nada menos de onze jogadores formados em Minas Gerais, dos quais o único a fazer sucesso no clube acabou jogando a carreira fora e a vida no lixo – o goleiro Bruno. Ney Franco errou feio na estratégia da Libertadores de 2007, mais ou menos como vem fazendo no São Paulo, e mostrou falta de pegada, exatamente como vem fazendo no São Paulo. A sensação que a gente tem é de que está confuso, perdido e não tirou brevê para pilotar times de ponta do futebol brasileiro. 
Outros dois que correm o sério risco de ver espadas apontadas para suas cabeças são Abel Braga e o indefectível Vanderlei Luxemburgo. Dirigem os dois elencos mais caros do país, mas seus times vivem de altos e baixos. Um fracasso na Libertadores deverá derrubar Luxemburgo automaticamente e também deve tornar insustentável a posição de Abel no Fluminense. Com título brasileiro e tudo. 
Para arredondar o texto e encerrar o post de hoje, retorno ao Serginho e sua expectativa pela volta dos bons jogos: ontem, São Caetano e Palmeiras se enfrentaram aqui na cidade. E aquilo lá, pra ser ruim, ainda faltou muito.

segunda-feira, 11 de março de 2013

Ganhou quem quis jogar bola. 
Já escrevi aqui no blog que sou totalmente contrário às disputas de pênaltis e que, por mim, empates em jogos decisivos seriam resolvidos com o bom e velho “primeiro gol acaba” das peladas. E no último post elogiei a fórmula de disputa do Campeonato Carioca, que ao menos consegue dar emoção àquela tosqueira. Esse ano o regulamento teve uma pequena mudança, acabando com as disputas de pênaltis e dando a um dos times a vantagem do empate por causa da campanha. Trata-se de um avanço, mas que quase criou um monstro, o que teria acontecido caso o Vasco vencesse o primeiro turno. Nada contra o clube, mas sim contra a forma que encontrou para tentar se valer da vantagem. Na semifinal, contra o Fluminense, o Vasco renunciou aos primeiros quarenta e cinco minutos. Deu o primeiro chute, de muito longe e para muito longe do gol, só aos trinta e dois, e não ameaçou em momento algum. E dizer que a tática deu certo é fazer como os comentaristas, que montam suas sábias análises depois do resultado. Não, não deu certo: o Vasco deu foi sorte, porque Thiago Neves chutou uma bola na trave, Fred perdeu dois gols que raramente perde e o zagueiro tricolor Anderson conseguiu chutar em cima do goleiro vascaíno Alessandro uma bola do meio da pequena área. No segundo tempo o Vasco aproveitou o cansaço do Fluminense, que viajara pela Libertadores no meio da semana, saiu pro jogo e a partida foi muito mais legal. Contra o Botafogo, o Vasco repetiu a dose, renunciando aos primeiros quarenta e cinco minutos. Mesmo uma anta matemática que nem eu – que no vestibular cravei C em todas as questões da prova de Matemática, acertei oito em vinte e cinco, escapei do zero que eliminava e me garanti nas outras matérias – consegue entender que, se você joga pelo empate, o jogo tem noventa minutos e você neutraliza quarenta e cinco, suas chances de perder reduzem-se à metade. Ou seja: não dá pra condenar o Vasco, mas isso faz com que o jogo fique arrastado e desagradável. Felizmente, futebol não tem nada a ver com Matemática, e o Botafogo correu atrás, fez seu belo gol já na reta final da partida e castigou a estratégia vascaína. Reconheço que não foi fácil torcer pelo Botafogo, porque é desanimador escolher um time que escala o Rafael Marques de centroavante – não por acaso, o gol só saiu depois que ele tinha sido substituído –, mas não dá pra torcer por quem não quer jogar. E foi bacana ver o título do primeiro turno ficar com quem entrou em desvantagem, tanto na semifinal da semana passada quanto na final de ontem. 
No outro domingo, botei pra gravar o jogo entre Santos e Corinthians, enquanto assistia a Flamengo e Botafogo. Não sou desses que acham que futebol é só gol, e por isso torcem o nariz automaticamente pra todo zero a zero, mas convenhamos. Ver jogo gravado já é meio esquisito. Ver, gravado, um jogo que não valia nada, mais ainda. Ver, gravado, um jogo que não valia nada, terminou zero a zero e todo mundo garantiu que foi chato à beça, aí seria demais. Tomei a única atitude possível: apaguei a gravação. Ontem, botei pra gravar São Paulo e Palmeiras, enquanto assistia a Vasco e Botafogo. Outro jogo gravado que não valia nada e terminou zero a zero, mas eu queria ver o Ganso jogar. Meu irmão Mário e meu amigo Jó sempre defenderam a tese de que o Ganso é enganador. Eu sempre discordei, mas preciso reconhecer que está cada vez mais difícil sustentar os argumentos. Existe uma diferença enorme entre saber jogar bola e ser um grande jogador de futebol. Os times brasileiros estão cheios de caras que, claramente, sabem jogar bola, mas não conseguem se transformar em grandes jogadores. (Valdívia é um ótimo exemplo. Sabe jogar bola, mas não passa de um tremendo peladeiro.) No primeiro semestre de 2010, Ganso foi um jogador de futebol de verdade – e extraordinário. De algum tempo pra cá, a gente percebe que a visão de jogo continua muito boa, o toque de bola continua elegante, a inteligência continua muito acima, mas não dá pra dizer que ali está um grande jogador de futebol. Diferentemente do que pensam meu irmão Mário e meu amigo Jó, continuo achando o Ganso um jogador raríssimo, em quem vale a pena investir e por quem vale a pena esperar, mas tá demorando demais. Acho que ontem ele foi mal substituído – Jádson tinha que entrar, só que não era o Ganso que tinha que sair – mas o fato é que, mesmo com um a menos, o São Paulo ficou mais rápido e perigoso depois que Ganso e Luís Fabiano saíram, e Jádson e Osvaldo entraram. 
Por falar em Luís Fabiano: não vi São Paulo x Arsenal de Sarandí na última quinta-feira, mas assisti ao finalzinho do jogo e ainda acompanhava a transmissão da TV quando ele foi expulso. Foram alguns minutos do centroavante andando atrás do juiz Wilmar Roldan e falando um monte, até que o árbitro perdeu a paciência e levantou o cartão vermelho. Injustiça. Pena não ter sido possível fazer leitura labial, mas conhecendo o Luís Fabiano como a gente conhece, é fácil supor que ele estava ali, dedo em riste, desferindo elogios rasgados à atuação do juiz e celebrando a moral indiscutível da colombiana mãe de sua senhoria. Estranheza maior foi que ninguém do São Paulo – comissão técnica, jogadores titulares, jogadores reservas, massagista, absolutamente ninguém – foi lá para tirar o Luís Fabiano de campo. Fiquei com a sensação de que até os profissionais de futebol do São Paulo já estão de saco cheio do Luís Fabiano.

segunda-feira, 4 de março de 2013

Lista de punições. 
Outro dia aconteceu um lance curioso e emblemático no jogo entre Fluminense e Botafogo, pelo primeiro turno do campeonato carioca. Depois de um choque na intermediária do Flu, o volante colombiano Valência ficou caído, como se tivesse levado um daqueles elegantes chutes do Anderson Silva. O Botafogo tinha pressa, Seedorf se irritou com a cera, abaixou o corpo e disse algumas besteiras no ouvido de Valência. Um doce pra quem adivinhar o que aconteceu. Claro: Valência se levantou rapidamente, cheio de disposição, querendo partir pra briga com o holandês. Nunca vi cura tão rápida. Diante disso, e após a história da punição ao Corinthians ter desencadeado uma série de reivindicações para tentar moralizar de vez a Libertadores, montei uma listinha básica de punições que deixariam os jogos de futebol no Brasil muito mais bacanas. Vamos a ela: 
Jogador que sofre falta e faz com a mãozinha aquele gesto pedindo cartão amarelo. Ok, cartão amarelo. Pra ele. 
Jogador que se joga de carrinho na bola, depois que ela já saiu pela lateral, só pra fazer média com a torcida. Cartão amarelo. 
Torcida que vibra com o jogador que dá o tal carrinho. Três jogos de estádio vazio, no estilo Corinthians e Millonários, além da obrigação de comparecer a três partidas do Novo Basquete Brasil. 
Torcida que vai ao delírio com volante botinudo dando bico pra lateral. Seis jogos de estádio vazio, mais a obrigação de acompanhar seis partidas de showbol. 
Torcida que canta “o campeão voltou”. Dez jogos de estádio vazio, mais a obrigação de acompanhar dez jogos de futebol feminino. 
Jogador que comemora gol com dancinha. Cartão amarelo. 
Jogador que comemora gol fazendo coraçãozinho. Cartão amarelo e um beijo no coração. 
Jogador que comemora gol apontando para o céu, sem atinar para o fato de que, obviamente, Deus se esqueceu do goleiro adversário. Cartão amarelo, vinte Pai-Nossos e trinta Ave-Marias. 
Jogador que fica rolando no chão com dores lancinantes, mas ao ser retirado do campo toma meio gole de água junto à linha lateral e imediatamente pede autorização ao juiz pra voltar. Não volta. Chuveiro. Cartão vermelho. 
A caixa de comentários do blog está à disposição de quem tiver outras sugestões. 
Tecnicamente, o campeonato carioca é muito inferior ao paulista, mas a fórmula de disputa o deixa bem mais divertido. A divisão em dois turnos curtos, com oito jogos no primeiro e sete no segundo, exige mais atenção por parte dos clubes grandes, porque a combinação de uma ou duas bobeiras de um grande com um pouco mais de atrevimento de um pequeno pode tirar o grande das semifinais. Nesse primeiro turno, por exemplo, faltou muito pouco para o Boavista deixar o Fluminense de fora – o que, aliás, aconteceu em 2011. E nas semifinais, o mata-mata quase sempre faz os jogos ficarem emocionantes. Ontem, Botafogo e Flamengo fizeram uma partida fraca, mas com um segundo tempo bem bom de ver. O segundo tempo de Vasco e Fluminense, então, foi sensacional, com os cinco gols e as duas viradas. Eu seria capaz de apostar que nem Roberto Dinamite acreditava na vitória do Vasco, depois que o Fluminense virou pra dois a um em dois minutos. Surpresa total. O que não chegou a surpreender foi a vitória do Botafogo sobre o Flamengo. A torcida rubro-negra terá que ser sábia e humilde. Sábia para compreender que não há como 2013 ser um grande ano para o time, mas que pode ser um ano decisivo na história do clube. E humilde para olhar, por exemplo, pro Corinthians, e entender que, se não der o primeiro passo, o Flamengo nunca vai chegar lá. Agora, vamos combinar que Dorival Jr. bem que podia dar uma forcinha. Claro que a tarefa dele é inglória, mas não dá para, entre outras coisas, jogar com volantes tão lentos quanto Cáceres e Renato Abreu. Dorival escalou mal, substituiu mal e não conseguiu deixar o time concentrado desde o primeiro minuto. Deu mole. 
Estudei com dois jornalistas esportivos famosos e rubro-negros fanáticos: Roberto Assaf, no Colégio Padre Antônio Vieira, e Renato Maurício Prado, na PUC. No DVD “Herois de uma nação”, que mostra a trajetória do timaço que o Flamengo montou no final da década de setenta e que acabou ganhando a Libertadores e o Mundial Interclubes de 81, além dos campeonatos brasileiros de 80, 82 e 83, Renato Maurício conta uma história bacana. Era o dia 3 de março de um ano qualquer e ele, Renato, recebeu um telefonema do Assaf. Depois dos cumprimentos de praxe, recomendações à patroa e tal, houve o seguinte diálogo: 
– Renato, você sabe que dia é hoje?  
– Sei, ué, hoje é dia três de março. 
– Não, Renato, hoje é Natal. Três de março é o dia em que nasceu o salvador. 
Para entender a importância de Zico para o Flamengo, tem que ser rubro-negro e tem que ter a idade que, mais ou menos, eu, Roberto Assaf e Renato Maurício Prado temos. O salvador chegou para nos redimir de todo o sofrimento causado, em nossa infância futebolística, por adversários como Cabralzinho, Paulo Borges, Gérson, Jairzinho, e por suspeitíssimos aliados como Buião, Michila, Onça e Caldeira. Da mesma forma que o Santos jamais terá outro Pelé e o Boca Juniors jamais terá outro Maradona, o Flamengo jamais terá outro Zico.